O fim de tarde pousa para lá da janela aberta, feito cetim que sustenta nos braços o cantar das aves que regressam às copas das árvores. O ar faz-se leve, fresco, como uma manta onde se sentam os risos despreocupados das crianças que brincam na praceta, enquanto (...)
Prendem-se na teia sentimentos, O dito e o não-dito, O pensamento distraído e absorto De quem deixa a mente divagar Por espaços escondidos da alma. É um reencontro de si mesmo, Chegar a lugares que ondulam Como finos fios tecidos Num tempo e num espaço alheios ao (...)
Foi na encruzilhada de palavras Que encontramos o inesperado: O longe, tornou-se perto, O não, tornou-se sim, E o impossível foi possibilidade! No início, palavras corriam soltas, Significados planando ao vento, Saltitando entre frases leves que se ficavam Quando só o (...)
Parto na manhã ainda pequena, quando o ar arrepia-se de frio e o orvalho mal começa a derreter-se nas ervas adormecidas. Na hora jovem os telhados húmidos ainda estão despidos de pássaros, e nas estradas vazias só os primeiros raios de sol tocam o gélido alcatrão, (...)
E que tal um poema? Não um poema qualquer! Tem que ter luz... Sílabas em som, Porque não? Ser poesia escancarada, Ter todas as cores do mundo. Tem que cair das madrugadas, Divagar em longas tardes de estio E amar muito à noite, devagarinho! Que tal um poema? Tem que (...)
Às vezes parece-me tudo irreal, ou como um sonho estranho: tu, a tua existência, que aos poucos imprimiste em mim, as palavras que outrora trocamos. Lembro-me de, na altura, pensar que realmente poderias ter vindo de outros mundos longínquos, outras eras, tempos (...)
Está calor, um calor repentino que cai de um céu cada vez mais escuro. O ar torna-se pesado, estagnado: nem uma só folha se move nas árvores em alerta, nem uma só erva a abanar no jardim bem cuidado. E o silêncio sente-se como matéria, cresce, à espera de um (...)
Posso sentar-me ao teu lado? Gosto de te ver ao sol, corpo repousado no banco de pedra ali colocado há muito tempo. É lindo esse momento tão teu, em que te esqueces das horas e de tanto mais, para apreciares, descontraído finalmente, a tarde dourada que se mostra a ti (...)
Sei que a tarde te traz de volta a ti mesmo. Há muito tempo que é assim, não é? As tardes pertencem-te, mesmo quando se elevam enormes, tremendamente demoradas, arrastando-se mudas à tua frente! É nessa altura do dia que consegues respirar fundo as sedentas ideias (...)
Olhas o jardim que é teu, onde as flores sabem o teu nome e os ramos altos das árvores de fruto te acolhem dia após dia. Gentes passeiam-se por caminhos onde se cruzam com outros como tu, alheios às marés distantes e esquivos à pressa das estações. Cães risonhos (...)