Esse Azul
Perdi-me e encontrei-me nesse dia. Não era só o azul. Era esse azul ser ele próprio o próprio mar entornado à minha frente, e que ia até ao azul desmedido do céu selvagem.
Era esse azul ser a infinitude de tudo, a grandiosidade que me deixava fazer parte dos reflexos do sol que ofuscavam a superfície das águas, feitas de uma alma crua e nua como a minha.
Era esse azul autorizar-me a ser eu a gaivota que deslizava entre o passado e o futuro, sacudindo com a força das asas os segundos gastos das horas antigas.
E era ser eu todas as tonalidades azuis que contemplava naquele instante imediato, todas e cada uma dessas tonalidades sucumbindo dentro e fora de mim.
Mas acima de tudo isso, sim, era o azul do mar. Esse azul íntimo que em dias de temporal parece ser verde aceso; que em dias de chuva interminável e triste assume um tom cinzento frio; e que se veste de um tom âmbar sempre que o sol se dilui no horizonte, lembrando fogo refletido num espelho partido em minúsculos pedaços.
Uma vez mesmo julguei ver o mar adormecer por completo a sua cor azulada, ganhar um tom que lembra o chumbo derretido, negro, moldável antes de endurecer, a contrastar com o areal triste e as penas brancas das aves paradas na zona da rebentação. E na falta da sua cor habitual, compreendi.
Sim, o azul do mar lembra olhares que entram noutros olhares, e fazem o mundo diminuir até caber por inteiro na palma da mão - ou no coração que se agita quando sonha muito e quer ainda mais, porque só o sonho não chega.
Compreendi, e desde esse instante (em que o azul foi o próprio mar) entre tantas outras cores amei essa em específico. Fui oceano, fui firmamento, e sonhei contigo pela primeira vez.
Compreendi. É esse o poder do azul quando o azul é mar: faz sonhar.
Nota: Desafio Azul