Encontro no Café
Permanecemos na luz branca e dócil que abraça o salão, enquanto lá fora, indiferente à nossa conversa, a vida prossegue pelas ruas atarefadas do dia novo, ainda sem dono.
De tudo falamos: de mistérios que não se podem explicar, porque só podem ser sentidos por quem consegue lá chegar. De palavras singulares, translúcidas, tão carregadas de poder que não devem ser pronunciadas, apenas vividas no instante imediato, antes que o tempo se vá embora. De momentos que devem permanecer resguardados dentro da força de algo maior, ou da hora limpa de uma manhã como esta, que promete ser infinito. E da certeza deste nosso encontro que é reencontro, como chegar a um lugar pela primeira vez e sentir que nunca de lá se partiu.
Para lá da cumplicidade das vidraças mudas, risonhas, tão cheias do nosso imaginário, as ruas arejadas. Carros, peões, fumo, odores, barulho. E todas essas ruas ficam dentro de nós. No fundo, só nós sabemos por onde andamos na hora do regresso a nós mesmos. Nós e Deus. E o encontro ganha maior sentido.