Se Tiver Que Chover, Que Chova
E se tiver que chover,
Que chova!
Que do céu cinzento
Interrogativo, calado,
Chovam poemas antigos,
Tempos distantes,
Músicas de outrora!
Que se soltem odores
E se abram cores
Na superfície dos meus sentidos
Que inocentes a ti se rendem.
Se tiver que chover,
Que chova!
Que a chuva seja gradação,
O derradeiro toque teu,
(Convergente, divergente)
Que escorrega habilidoso
Por esquinas minhas
E ruas sem nome,
Neste meu corpo de menina-mulher
Que não precisa de mapa ou bússola
Para saber que perfume
A terra liberta no ar
Quando a chuva a molha;
Ou que aromas trazes tu
Dos céus e trovoadas
De lugares longínquos,
Onde um xamã celebra a dádiva da vida...
Se tiver que chover,
Que chova!
Chuva promiscua, insolente,
Atrevida, obediente!
Que pássaros cantem
E trevos brilhem
Nos relvados cerrados
Ou entre as pedras da calçada!
Que se pintem telas,
Se escrevam sonetos,
Que amantes se declarem!
E que a chuva sejas tu
Em toda a tua dimensão,
Sílabas precipitadas em mim
Num lindo dia de amor indefinido!