Simples Folha Seca
Esvoaça a folha seca nas rajadas do vento impiedoso. Enquanto altiva expõe a sua cor dourada pelas janelas e parapeitos por onde passa, esconde nos seus veios sem vida um pouco do verão que se afasta de ombros descaídos, contendo muito a custo suspiros melancólicos.
Sabe a folha que novas e excêntricas cores cobrirão jardins e parques, tons quentes e coloridos vindos sabe-se lá de onde; sabe a folha que novos cheiros serão apanhados por musgos frescos e cogumelos tímidos, pelos narizes húmidos dos cães saltitões, e pelo riso alto das crianças que brincam na praceta após um dia de escola. Sabe a folha que velhos caminhos serão forrados de outono, e que novos passos esmagarão tantas outras folhas secas como ela.
Mas não sabe o resto: que com a queda das folhas, no silêncio de um quarto, entre sombras e música baixa, caiem também ao chão as roupas e os pudores daqueles que se amam, e que perdidos na luxúria e no capricho de um amor que se cumpre sem tempo marcado, não sabem (nem querem lá saber!) se já é outono, inverno, ou ainda verão... Para esses, é sempre primavera, e uma folha seca como ela será só, e apenas só, uma insignificante folha seca, uma entre outras tantas, por mais bela e altiva que a sua cor seja.