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Sílabas à Solta

POESIA | PROSA POÉTICA

Sílabas à Solta

POESIA | PROSA POÉTICA

Tempo

14.06.21 | Sandra

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Hoje o tempo é meu. Nada fazer além do necessário. Dar colo às horas, afagar os minutos e soprar um beijo sobre os segundos. Hoje o tempo é meu aliado. Um banho, onde me demoro entre densos vapores e suaves odores que lembram os intermináveis dias de estio, livres e quentes. Uma vela perfumada, um café bebido entre jogos de luz-sombra que tornam o banho mais sumptuoso e relaxante. E sem horas...

Roupa leve, solta, confortável. Cabelo entrançado. Creme e perfume. Música que toca baixinho. Chocolates e uma bebida fresca.

Relaxar. Desfrutar o silêncio quente da rua, o sol que ousa passar pela janela aberta, as cortinas finas e transparentes que balançam muito devagar, a minha própria companhia. Ignorar o relógio e sonhar. Contigo, comigo, com o que for. Gosto tanto de ti... espero que o sintas, que te gosto.

Na certeza do meu Deus, embalo-me nos vagares do dia, que desta vez está livre como eu e avança manso. Apenas saio de casa para me sentar no banco fresco de cimento liso, à sombra morna dos plátanos, para me entregar às carícias lentas da brisa no meu pescoço, nos meus ombros nus. Fecho os olhos e foco-me apenas nesse sentir que me parece vindo de beijos perdidos, enquanto à minha volta pássaros saboreiam também a preguiça deste dia de muito calor. Cheira a terra seca, à relva quente e às ervas secas dos campos em meu redor.

Entre passos que não se sentem, entre o capricho de nada fazer, o dia traz pela mão a noite, imensa toda ela, também. Sem tempo, tal e qual como eu própria o exijo. Lençóis frescos. Estores descidos, vidro completamente aberto. Candeeiros de rua de luz amarela, traças que dançam sobre os seus globos transparentes. Céu negro e macio. Estrelas, constelações, planetas. Todo um universo sedutor e perigoso, inexplicável e agressivo, intenso. E tu.

Todo o meu corpo pede para sair um pouco, caminhar pela noite que pousa na praceta onde algumas pessoas conversam e cães descansam, no calar das aves que agora dormem. Mas amanhã é dia de acordar cedo. Regresso a casa, ligo a televisão, baixo o volume e trago ao de cima memórias tuas. Palavras tuas. Deixo-as ficar deitadas comigo na intimidade dos lençóis e da noite, encostadas ao meu corpo. Agora sim, vejo que horas são. Nada de novo: o tempo retoma aos poucos o seu próprio ritmo. Já não é meu. 

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